terça-feira, 14 de abril de 2015

À mercê das demandas e mudanças globais

A agricultura teve seu início ainda na pré-história, quando comunidades de caçadores e coletores perceberam que sementes enterradas davam origem a plantas iguais às originais. O cultivo do solo se desenvolveu por milhares de anos, aumentando significativamente sua produtividade e uso de tecnologias ao longo do tempo. Com o aumento da demanda por matérias-primas na Revolução Industrial, técnicas como o uso de máquinas ao invés de animais foram inventadas para aumentar a colheita. Ademais, não podemos deixar de citar a Revolução Verde, que foi responsável pela implantação das técnicas que são ainda utilizadas na agricultura em larga escala, como o uso de fertilizantes sintéticos, agrotóxicos, sementes híbridas e manipulação genética. Este processo ocorreu em meados do século XX, tendo como principal líder o americano Norman Borlaug, que acabou por ganhar o Nobel da Paz por seus esforços em pesquisas de melhoramento agrícola.
            No entanto, como previu o economista Thomas Malthus no século XIX, o aumento da produção material encontra um limite no esgotamento da capacidade dos ecossistemas, o que tem levado atualmente a um fortalecimento do movimento contracorrente, retomando valores do período pré-Revolução Industrial. Em países de capitalismo avançado já é notável a preferência por um tipo de cultivo diferenciado, indubitavelmente mais sustentável e harmônico com o meio ambiente.
Assim, estas alternativas ao sistema tradicional de produção agrícola vêm sendo buscadas a fim de solucionar alguns dos problemas da sociedade atual: a fome, as mudanças ambientais e a perda da biodiversidade, questões em que as políticas de cultivo da terra tem importância decisiva. A agricultura familiar é uma prática que, frente a essas problemáticas globais, vem recebendo cada vez mais incentivos de órgãos micro-empresariais e políticos, abrangendo conceitos socias, econômicos, ambientais e de conservação biológica.
            Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, a agricultura familiar é definida como o meio de organização agrícola, silvicultura, pesca, pastoreio e produção de aquaculturas, que são manejadas e operadas por uma família e predominantemente nas propriedadas familiares. A família e a terra estão unidas e co-evoluem e combinam funções econômicas, ambientais, sociais e culturais. Não há um padrão em termos de tamanho, acesso ao mercado, características do plantio, e, portanto, cada uma apresenta necessidades e sistemas de inovações diferentes.
            As técnicas tradicionais latifundiárias que visam o suprimento em grande escala do mercado, tanto regional quanto internacional, já mostraram serem ineficientes em longo prazo, afetando, a priori, a manutenção dos ciclos naturais, biodiversidade e as relações ecológicas, e em última instância o bem-estar social e econômico. Desse modo, a busca por alternativas de curto e longo prazo vêm se tornando alvo de corporativas a fim de garantir a própria estabilidade no mercado competitivo, assim como a conscientização em relação à questão ambiental.
            No Brasil, a agricultura familiar foi definida por lei em 24 de Julho de 2006. Mesmo sob adversidades como insuficiência de terras e capital, e dificuldades no financiamento, a agricultura familiar responde por cerca de 35% do PIB nacional, e 84% dos estabelecimentos agropecuários do país são familiares, empregando a grande maioria dos trabalhadores agropecuários do país.

Selo da Identificação da Participação da Agricultura Familiar
criado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário,
 que informa ao consumidor se o produto comprado é
 ou não oriundo de atividade de agricultura familiar registrada.
A agricultura familiar é responsável por cerca de 70% dos alimentos produzidos no Brasil. Devido a essa enorme influência e a preocupação com o seu reconhecimento, o Ministério do Desenvolvimento Agrário criou, em 2009, o Selo de Identificação da Participação da Agricultura Familiar (SIPAF), que identifica os produtos de origem majoritária da agricultura familiar, ampliando a visibilidade desse tipo de produção e fortalecendo a identidade social da agricultura familiar junto aos consumidores.

A agricultura familiar é considerada uma prática interna da agroecologia capaz de promover o desenvolvimento sustentável. Em agroecossistemas, a própria biodiversidade realiza uma variedade de serviços que vão além da produção alimentícia, incluindo ciclagem de nutrientes, regulação do micro-clima e processos hidrológicos locais, supressão de organismos indesejáveis e desintoxicação do solo. Em curto e longo prazo, esse tipo de manejo garante continuidade no fornecimento de insumos e geração de riqueza, não apenas para o setor agropecuário, mas para a própria economia do país, o que ajuda a entender a importância estratégica essa forma de produção.


Autores: Aline Maria Lucchetta, Enrico Cerioni Spiropulos Gonçalves e Rodrigo Guedes Hakime. 


Bibliografia utilizada: 

  • ABELE S., FROHBERG K. Subsistence Agriculture in Central and Eastern Europe: How to Break the Vicious Circle? Institut Für Agrarentwicklung ung in Mittel-Und Osteuropa (IAMO), 2003.
  •  ABRAMOVAY, R. Alimentos versus população: está ressurgindo o fantasma malthusiano? Cienc. Cult. vol.62 no.4 São Paulo Oct. 2010
  •  ALTIERI M. A. The ecological role of biodiversity in agroecosystems. Agriculture, Ecosystems and Environment, Vol. 74, p. 19-31, 1999.
  •  BARNABA B. J. E. A Policy Paper on Moving Beyond Subsistence Farming and Investing in Modern Agriculture to Enhance Rural Development in South Sudan. Nyamilepedia, publicado online em 2015 <http://nyamile.com/2015/02/22/a-policy-paper-on-moving-beyond-subsistence-farming-and-investing-in-modern-agriculture-to-enhance-rural-development-in-south-sudan>
  •  FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS (FAO). Rural and Tribal Woman in Agrobiodiversity Conservation – An Indian case study. India, 2002.
  •  FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS (FAO). The State of Food and Agriculture – Innovation in family farming. Rome, 2014.
  • GLIESSMAN S. R. Agroecology: the Ecology of Sustainable Food Systems. CRC Press, 2006.
  •  HUSSAIN I., RASCHID L., HANJRA M. A., HOEK W. Wastewater use in Agriculture: Review of Impacts and Methodological Issues in Valuing Impacts. Working Paper 37. Colombo, Sri Lanka: International Water Management Institute, 2002.
  •  SIMS J. T., SIMARD R. R., JOERN B. C. Phosphorus Loss in Agriculture Drainage: Historical Perspective and Current Research. Journal of Environment Quality, Vol. 27, p. 277-293, 1998.


3 comentários:

  1. Olá! Muito legal o texto de vocês. Fomos pesquisar um pouco mais sobre a agricultura familiar no Brasil e encontramos uns valores bem interessantes: ela é responsável por 87% da mandioca, 70% do feijão, 60% do leite e 50% da carne de porco produzida, utilizando 24,3% das terras agrícolas (fonte de 2013).
    Paradoxalmente, constatou-se que 70% da miséria do atual século concentram-se nas áreas rurais dos países em desevolvimento. As razões apontadas para esse valor contraditório seriam o acesso restrito a recursos terrestres e hídricos, a falta de recursos maquinários agrícolas, além de que, frequentemente, a esses produtores de subsistência são ofertadas apenas áreas degradadas para que eles possam produzir.
    Dessa forma, cada vez mais mostrou-se de extrema importância a implementação de políticas públicas para o desenvolvimento sustentável. Dentre essas políticas, estão incluídos principlamente fomentos que levem em conta os conhecimentos próprios do produtor, insumos de qualidade, atenção às mulheres e agricultores jovens, fortalecimento das cooperativas; acesso à terra, à água e ao crédito.
    Essa questão está sendo tão amplamente debatida, que o ano de 2014 foi declarado pela ONU como o Ano Internacional da Agricultura Familiar. A FAO (Food And Agriculture Organization of the United Nations) estabeleceu alguns objetivos para introduzir com força o protagonismo da agricultura familiar no desenvolvimento sustentável: apoiar o desenvolvimento agricultural, ambiental e políticas sociais conducentes à agricultura familiar sustentável; atingir um melhor entendimento das necessidades, potencialidades e restrições da agricultura familiar, e garantir a ela suporte técnico.
    Fontes:
    http://www.fao.org/…/info…/infographics-details/en/c/230925/
    http://www.valor.com.br/…/atualidade-da-agricultura-familiar


    Abraços.
    Grupo 6 (Juliana, Maiara, Rafaella, Renan)

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  2. Muito interessante este texto. Eu mesma não sabia que a agricultura familiar era responsável por quase 70% dos alimentos produzidos no Brasil, e nem que o Ministério do Desenvolvimento Agrário criou o Selo de Identificação da Participação da Agricultura Familiar. Vou procurar dar preferência para este tipo de produtos.

    Wendy Ishimoto

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  3. Segundo o IBGE estabelecimentos com área maior ou igual a 100 hectares, representam 9,6% do total de estabelecimentos agrícolas, mas correspondem a uma área de 78,6% do total à atividade. O dado de 84% dos estabelecimentos agrícolas serem familiares acho q não diz muito, pois não evidencia a concentração de terra. E pra mim não ficou claro o que é a agricultura familiar, porque na prática eu a enxergo com mais preceitos do que a definição da ONU, pois esta abre brecha para que propriedades de proporções latifundiárias sejam incluídas porque pertencem a uma mesma família por gerações. Sobre o incentivo econômico e político da agricultura familiar, também tenho dificuldades para enxergar isso, principalmente no Brasil, onde temos um enorme crescimento da bancada ruralista no congresso nacional. Recentemente houve a liberação do eucalipto trangênico para plantio no Brasil, o que foi uma grande derrota para o movimento por terras, da agricultura familiar e da agroecologia, como podemos falar em apoio político e econômico à agricultura familiar diante dessa derrota.Infelizmente, não é um cenário de apoio político e econômico aos movimentos relacionados à agricultura familiar.

    Grupo 4

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